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5/31/2017

Terra de Cabinha: inventário afetivo das crianças do sertão

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
"Cabra da peste” virou “cabrinha”, que logo passou a ser só “cabinha”. O jeito de chamar as crianças lá no Cariri, transformado de boca em boca, revela a oralidade que tantas vezes substituímos pela linguagem escrita. Terra de Cabinha, título escolhido para o livro onde a jornalista Gabriela Romeu e o fotógrafo Samuel Macedo depositam as histórias das crianças da região, aponta, então, para uma intenção de natureza dupla: ao mesmo tempo em que quer resgatar a cultura oral de apreensão de saberes e fazeres, também discute a importância de transportar a memória intangível para o concreto do livro.
 
Fruto de uma extensa viagem pelos quatro Estados que formam o Cariri nordestino – Paraíba, Pernambuco, Ceará e Piauí –, o livro apresenta para a criança da cidade grande as brincadeiras, receitas, adivinhas, tradições, causos, receitas e costumes da criança do Cariri e seus incontáveis contadores de histórias. Histórias de meninos que viram reis, caçam jumentos e fogem de encantados.
 
Dessa imersão pelos quintais do Brasil, nasceu o projeto Infâncias, do qual este livro faz parte. Idealizado por Gabriela e pela também jornalista Marlene Peret, o projeto começou há três anos, com a proposta de investigar as diferentes culturas de infância que compõem o jeito brasileiro – e ao mesmo tempo global – de ser criança: a ludicidade. “O brincar é a língua universal da infância. As crianças brincam em todos os tempos, territórios e contextos. Ainda que confinadas nas escolas, que engessam corpos brincantes em carteiras enfileiradas, o impulso do brincar rompe a aridez imposta pelo mundo dos adultos”.
 
Publicado pela editora Peirópolis em uma edição de encher os olhos, Terra de Cabinha será lançado em São Paulo neste sábado, 20 de agosto (serviço completo abaixo), mas, antes,  viajou de volta para o Nordeste, onde passou pelas mãos dos cabinhas, matriarcas e mestres que puxaram essas histórias da memória, uma a uma. “Muitos dos cabinhas já estavam crescidos, alguns já não eram mais crianças. Vi meninos e meninas acariciando as páginas do livro como que tentando captar um momento de infância que se dissipou no tempo”, relembra Gabriela.
 
 
E o livro não se esgota em sua intenção de mostrar a criança daqui como é a criança de lá. Antes disso, transforma esses meros advérbios em lugar constante, de visitação sempre possível. Por isso, se transforma em um material rico de pesquisa sobre a brincadeira, a cultura da infância, e oralidade e a educação. Tanto é que o prefácio fica por conta de Gandhy Piorski, um dos maiores nomes da pesquisa da cultura do brincar no Brasil. Para exemplificar o grau de lirismo que permeia todo o livro, aqui vai um trecho da fala de Gandhy:
 
“A infância é um estado que se sustenta pelo contínuo trabalho de instilar, peneirar, filtrar o mundo. Crianças são como espécies de pássaros garis da natureza: fazem continuamente o trabalho de renovar as sobras do mundo, digerindo-as em uma calórica forja imaginadora, transformando-as em novos nutrientes, artefatos da brincadeira, crenças e certezas jovens, recém-nascidas, porém embevecidas de fascínio."
 
Quem quiser antecipar o mergulho nessa infância do Brasil profundo, pode acessar conteúdos extras do livro no site da editora, que disponibiliza áudios, vídeos, depoimentos, entrevistas e minidocumentários sobre esse universo.
Mais do que isso, só mesmo buscando junto de quem fez. Por isso, o Garimpo foi conversar com a Gabriela Romeu para saber quais as impressões e sensações trazidas por esse universo de encantarias infantis. O que ela conta não está no livro – sorte a nossa! – e vale cada linha!
 
 
 
Como começou a sua curiosidade de trabalhar com crianças deslocadas dos centros urbanos?
Ao atuar como jornalista dedicada à infância, eu sempre cobri as realidades infantis pelo Brasil. As pautas que mais me instigavam eram as que revelavam as infâncias: como é a vida das crianças numa ilha do Maranhão, das crianças angolanas que moram no Complexo da Maré, no Rio, ou as crianças ribeirinhas que têm o rio como estrada, entre outras realidades que tive a oportunidade de conhecer. Mas acho que essa história começou mesmo na minha infância, quando eu ouvia atentamente os relatos dos tempos de meninas de minha mãe e minhas tias, todas mineiras e cheias de prosa. Eu adorava ouvir as histórias dessa infância rural, pé na terra. Foi ali minha primeira incursão etnográfica pelas infâncias do Brasil profundo.
 
Em termos de cuidado com a infância, grandes centros urbanos estão muito aquém do ideal. Como você acha que podemos evoluir para que as cidades percebam melhor a criança?
Sempre que volto dos lugarejos que visito no Brasil profundo fico pensando o que perdermos nesse processo intenso de urbanização do país.... E acho que foi se dissipando com o tempo algo que precisamos resgatar: o senso comunitário, do viver em comunidade, o que é essencial para uma infância livre, autônoma. Nas comunidades tradicionais, as crianças andam livres pelos quintais, pois estão sendo cuidadas por todos, pelo tio, avó, vizinha. Sabe aquele dizer africano de que “é preciso toda uma aldeia para cuidar de uma criança”? Mas acredito que os movimentos todos que se disseminam pelas cidades, repensando o espaço público na dimensão do humano, podem ser um caminho para que a cidade acolha melhor as crianças e suas infâncias.
 
Depois desses quatro anos investigando diferentes culturas de infância, acha que existe um componente comum, uma espécie de ingrediente universal da infância, que faz um guri, um cabinha ou um piá serem crianças onde quer que elas estejam?
O ingrediente universal da infância é o brincar, a língua universal da infância. As crianças brincam em todos os tempos, territórios e contextos – às vezes mais, às vezes menos.  Eu me lembro de meninas que brincavam de pular elástico com os dedos, na sala de aula. Ainda que confinadas nas escolas, que engessam corpos brincantes em carteiras enfileiradas, o impulso do brincar rompe a aridez imposta pelo mundo dos adultos.
Percebo também outros aspectos que ligam as infâncias do Brasil profundo: um tempo menos fragmentado e segmentado, um aprendizado permeando a vida, um território muitas vezes convidativo ao exercício de ser criança, saberes compartilhados entre adultos e crianças na comunidade.
Há ainda os dilemas de crescer, os ritos de passagem, que fazem parte da vida de meninos e meninas por todo o Brasil, seja da cidade, seja do interior. Romper o mundo da infância e adentrar a adolescência é um desafio grande para todas as crianças. A diferença é que em algumas comunidades tradicionais ou em povos indígenas essa passagem é marcada, celebrada, ritualizada. No meio urbano, nas grandes cidades, os ritos muitas vezes se diluem no apressado da vida.
 
No prefácio do Terra de Cabinha, o artista plástico Gandhy Piorski diz que o livro apresenta as imagens fundamentais de uma “infância de cosmicidade”, um conceito de Bachelard. Pode explicar o que é isso, uma infância de cosmicidade?
Um desafio e tanto explicar os pensamentos de Gandhy Piorsky, que está para falar desse e de outros assuntos no livro Brinquedos do chão, que também será lançado pela editora Peirópolis. Mas vou fazer uma tentativa, bem breve. Uma infância cheia de cosmicidade abarca uma memória coletiva das origens do mundo, dos cosmos. É uma infância que enfrenta o medo da noite, que bem traduz os mistérios do mundo, e pressente que a natureza é sábia e também devoradora, pois ali vivem as Caboclinhas que levam as crianças para a mata profunda e os tios são também Lobisomens.
 
Ainda no prefácio do livro, destaca-se o fato de as crianças da cidade estarem perdendo o “valor nutricional dos causos, mitos, lendas, histórias e práticas de diálogo com o mundo natural”. Pra você, o que a falta de todos esses elementos causa a uma criança?
Eu cresci ouvindo uma tia querida, Cida, contando causos de medo em noites em que dormíamos encolhidas – eu me lembro e ouço vivamente a sua voz e sinto ainda hoje o cheiro do talco que ela usava. Eram histórias sobre diabinhos e outras criaturas amedrontadoras que habitaram a infância de minha tia e, narradas para mim naquelas noites, passaram a habitar a minha também. São histórias que nos conectam com imagens poderosas da ancestralidade e das origens, como nos diz Gandhy Piorski. É uma triste perda deixarmos de nos conectar com essa mitologia que vem sendo cultivada no imaginário da humanidade há tempos. E o pior é que, em muitos casos, histórias dessa natureza sofrem de uma assepsia tamanha, tornam-se rasas e sem força, como se a criança não fosse forte o bastante para encarar o poder das encantarias do mundo.
 
No livro, está muito presente a cultura da oralidade, crianças que absorvem saberes de seus avós, por meio das histórias. Isso se perdeu no cotidiano da vida nas cidades?
O momento de contar histórias se perdeu em muitos lugares – e não só nas cidades grandes. Por onde eu ando procuro os narradores de histórias. Uma vez perguntei a uma senhora contadora de histórias sobre os Lobisomens que rondavam seu povoado. E ela disse: “Não apareceram mais depois que a luz chegou por aqui”. O imaginário vai sendo alimentado pelas histórias narradas na TV, num livro, no cinema e nos games. Mas acredito que é preciso insistir nesses momentos das histórias de boca, as narrativas da oralidade, cheias de afetos outros, com as crianças em casa, na escola, no bairro, na comunidade.
 
Samuel Macedo dedica o livro ao seu pai, Chico, por tê-lo deixado ser criança. O que é deixar ser criança?
Entendo que é permitir o exercício de crescer, sem agendas estressantes e com tempo para o ócio inventivo das crianças. Criança precisa de tempo e de espaço; o resto ela inventa.
 
 
 
Como foi o retorno ao Cariri com o livro pronto? Como os cabinhas reagiram quando viram suas histórias formatadas em um livro?
Foi muito especial o retorno ao Cariri depois de muitas andanças por lá. Eu e o fotógrafo Samuel Macedo percorremos muitas localidades procurando os cabinhas do livro para devolver-lhes as imagens e as histórias que nos ofertaram em momentos de afeto e diálogo. Muitos dos cabinhas já estavam crescidos, alguns já não eram mais crianças. Vi meninos e meninas acariciando as páginas do livro como que tentando captar um momento de infância que se dissipou no tempo. Também visitamos os terreiros dos mestres e dos contadores de histórias, que ficaram gratos com o reencontro. Situações intensas ocorreram. Ao batermos na casa do Tio Tonho, estávamos ávidos em entregar o livro para aquele avô cheio de histórias. Um cabinha que nos recebeu contou que ele tinha morrido há alguns meses. Chegamos atrasados praquele encontro. Deu um aperto no peito e a constatação (óbvia, aliás) de que, se os livros cristalizam uma história ou um momento em palavras e imagens, a vida segue seu curso.
 
Além do retorno para apresentar o livro, o projeto prevê algum tipo de continuidade junto às crianças dos lugares por onde passou?
O “Infâncias”, idealizado por mim com a jornalista Marlene Peret e com a parceria de vários amigos queridos – Michelle Antunes, Vanessa Fort e Gabriella Mancini, além de Samuel Macedo –, é um projeto que prevê alguns desdobramentos em forma de livro, filmes e exposições a partir de pesquisas feitas com as crianças. Para o Cariri, finalizamos também um curta-metragem documental, Meninos e Reis, que traz o fascínio dos cabinhas pelo reisado, um folguedo bem popular na região. O filme está rodando festivais – e ganhou o prêmio de melhor documentário na tradicional Mostra de Cinema Infantil de Florianópolis. Queremos muito seguir no diálogo com as crianças do Cariri e há ideias de outros projetos. Mas vamos neste semestre nos dedicar a espalhar as notícias dos cabinhas para conectar realidades e criar a ponte entre infâncias que estão tão longe e tão perto de todos nós.
 
O que está por vir? Que projetos está desenvolvendo no momento?
Temos mais dois livros para publicar e estamos trabalhando no desenvolvimento de uma série de TV com narrativas de crianças de todo o Brasil em parceria com outras duas produtoras – e espero logo poder dar mais detalhes sobre esse projeto! No mais, gostaria de voltar à estrada no ano que vem, fazer outras incursões e seguir no diálogo com as infâncias brasileiras
 
 Fonte: Garimpo Miúdo
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

5/26/2017

Espaço Cultural da Marinha


Assim que você entra no Espaço Cultural da Marinha, a Galeota D. João VI, construída em 1808, vai levá-lo ao século XIX e esteve em uso até os primeiros governos republicanos. E a viagem continua a bordo do submarino Riachuelo e da Nau dos Descobrimentos, que estão atracados ao cais do Espaço e você poderá conhecer o helicóptero do museu.Há uma exposição aberta ao público, ” Azul da cor do mar ” , onde apresenta a importância do desbravamento dos mares a partir das Grandes Navegações.

Espaço Cultural da Marinha
Av. Alfred Agache, s/n – Centro (próximo à Praça XV)
Tel.: 2104-5592
Visitação: terça a domingo, das 12h às 17h
Agendamentos para grupos: 2104-6992/ 2104-6721 (telefones de segunda a sexta)
Gratuito
Os ingressos para o Submarino-Museu “Riachuelo” e Navio-Museu “Bauru” são vendidos das 11h às 17h
R$10,00 (Inteira)/R$5,00 (Meia)

5/25/2017

Brincadeira que estimula o tato e o reconhecimento de cores para crianças com deficiência visual

A Patcamargo e a Patricia Marinho do site Tamo Junto, volta e meia recebem pedidos de brincadeira que contemple crianças com deficiências. Por conta disso achei legal publicar este post, Elas foram buscar informação com especialistas no assunto, que pudessem nos orientar sobre dicas para adaptar brincadeiras possibilitando a inclusão.
Um destes grupos que Elas buscaram foi a Associação Brasileira de Assistência à Pessoa com Deficiência Visual, ou simplesmente, Laramara, uma das referências em atenção à criança com deficiência visual de São Paulo. Além de conversar com os profissionais de lá, conhecer a brinquedoteca deles e ser apresentada ao livro Brincar para Todos (gratuito, de 2005), Elas acompanharam o trabalho com duas turmas de crianças e conheceram as brincadeiras feitas na Laramara.
aproveitar-a-brincadeira-como-meio-de-inclusao-da-crianca-com-e-sem-deficiencia-livro-brincar-para-todos

"Saí de lá com a sensação que, com algumas ressalvas, as brincadeiras feitas lá eram próximas, senão iguais às que fazíamos no Tempojunto. Isso ficou guardadinho. Depois de algum tempo, publicamos aqui um post falando sobre a brincadeira como sendo a mais inclusiva das atividades para a crianças. No post, duas especialistas em psicologia e neuropsicologia dão um passo a mais na explicação sobre a relação do brincar e a deficiência. Outra vez a sensação de estarmos num caminho sem tantas distinções assim nas brincadeiras e brinquedos caseiros." - Conta Patcamargo.
aproveitar-a-brincadeira-como-meio-de-inclusao-da-crianca-com-e-sem-deficiencia-criancas-brincando-na-cadeira-de-rodas

Tinta e sagú

"A brincadeira que aprendi no Laramara que vou mostrar precisa de materiais simples: tinta de duas cores bem contrastantes, como azul e amarelo; sagú ou bolinhas de isopor e papel sulfite ou tipo craft."
Separe as tintas em duas vasilhas grandes, em que as crianças possam colocar as mãos livremente. Em uma delas, coloque o sagu ou as bolinhas de isopor (precisam ser das bem pequenas).
Brincadeira que estimula o tato e o reconhecimento de cores para criancas com deficiencia - painel com as bolinhas
Deixe a outra sem nada.
Chame as crianças para brincar. Estimule-as a criar desenhos com as mãos sem misturar as tintas, apenas sentindo diferença sensorial provocada pelas bolinhas. “Se para toda criança a brincadeira é muito importante, para a criança com deficiência visual ela é fundamental”, afirma Mara Siaulys, fundadora do Laramara em seu livro Brincar para Todos.
Esta é a foto que do trabalho que eles fizeram.
Brincadeira que estimula o tato e o reconhecimento de cores para criancas com deficiencia - painel pronto
"O mais legal é que a brincadeira que estimula o tato e o reconhecimento as cores trabalha o sensorial em todas as crianças. Para as com cegueira total, a cor pode ser entendida pelo tato. Já as que tem baixa visão, conseguem diferenciar também pelo contraste das cores escolhidas. E as crianças sem estas deficiências experimentam também o sensorial e o visual. A boa notícia que a entrevista com a jornalista, mestra e doutoranda em Educação e Inclusão, Meire Cavalcante traz é que as brincadeiras são mesmo inclusivas e, os pais de crianças com deficiência não precisam se preocupar em adaptar brincadeiras para seus filhos."
Se você se interessa pelo assunto, vale à pena ver a entrevista com a Meire e os outros posts que fizemos sobre o assunto.
Fonte: Tempo Junto

5/24/2017

10 começos incríveis da literatura infantil e juvenil



Quando se fala em começos na literatura, logo vem à mente uma porção de inícios inesquecíveis de grandes clássicos. "Lolita", "Cem Anos de Solidão", "As Intermitências da Morte", "Grande Sertão: Veredas".  E na literatura infantil, quais seriam os começos mais marcantes? Se o livro precisa concorrer com o mundo cada vez mais preenchido de estímulos, onde as crianças recebem cada vez mais informações, as primeiras páginas devem ser os fios inevitáveis que nos puxam pela mão e levam para dentro de um universo desconhecido e insubstituível.
 
Vasculhando a nossa memória de leitor, talvez nos lembremos de como foi, ainda criança, ler as primeiras linhas da coleção Vagalume, de Viagem ao centro da terra, Marcelo Marmelo Martelo, Meu pé de laranja lima, Memórias de Emília e tantos outros. Foram eles os começos que nos guiaram em nossos primeiros passos de leitor.
 
É um arrebatamento diferente aquele que o toca o leitor quando ele ainda está descobrindo o tamanho das palavras, o peso do discurso e como uma coisa e outra reverberam muito além do nosso controle.
 
Voltar a esses começos é conhecer melhor o leitor que somos hoje. Por isso, o Garimpo faz essa brincadeira: misturando diferentes estilos literários e períodos de publicação, listamos 10 inícios inesquecíveis da literatura infantil e juvenil. Aqueles que, mesmo depois de lidos três, quatro, cinco vezes não terminam de dizer o que querem dizer. Começos que podem ser três parágrafos ou uma linha só.
 
E como toda escolha é feita de memória, a conclusão aqui é metalinguística: uma lista de inícios que nunca terminam de começar.
 
 
1. Peter e Wendy – James Matthew Barrie (Cosac Naify, 2012; reedição)
 
 
 
"Todas as crianças crescem, menos uma. Logo ficam sabendo que irão crescer, e Wendy sabia disso pelo seguinte motivo: um belo dia, quando tinha dois anos de idade, estava brincando num jardim, colheu uma flor e saiu correndo com ela em direção a sua mãe. Imagino que a menina devia estar linda, porque a sra. Darling pôs a mão no peito e exclamou:
- Ah, por que você não pode ficar assim para sempre?
Nada mais foi dito entre as duas sobre o assunto, mas Wendy ficou sabendo que um dia precisaria crescer. Dois anos é o começo do fim."
 
 
 
 
 
 
 
2. Dentes de rato – Augustina Bessa-Luís (Peirópolis, 2006; reedição)
 
Lourença tinha três irmãos. Todos aprendiam a fazer habilidades como cãezinhos, e tocavam guitarra ou dançavam em pontas dos pés. Ela não. Era até um bocado infeliz para aprender, e admirava-se de que lhe quisessem ensinar tantas coisas aborrecidas e que ela tinha que esquecer o mais depressa possível. O que mais gostava de fazer era comer maças e deita-se para dormir. Mas não dormia. Fechava os olhos e acontecia-lhe então uma aventura bonita e conhecia gente maravilhosa. Eram as pessoas que ela via no cinema ou que ela já tinha encontrado em qualquer parte. Não gostava de ninguém que se pusesse entre ela e a imaginação, como um muro, e não a deixasse ver as coisas de maneira diferente. Não gostava que lhe tocassem e, sobretudo, que a gente grande pesasse com a grande mão em cima de sua cabeça. Apetecia-lhe morder-lhes e fugir depressa. Mas não fazia nada disso.
 
 
3. As aventuras de Pinóquio – Carlo Collodi (Cosac Naify, 2012)
 
 
 
- Um rei! – dirão logo os meus pequenos leitores. Não, meninos, vocês se enganaram. Era uma vez um pedaço de pau.
Não de madeira de lei, mas um simples pedaço de lenha, desses que no inverno atiramos nos fogões e nas lareiras para acender o fogo e aquecer os aposentos.
Não sei como a coisa aconteceu, mas a verdade é que um belo dia esse pedaço de pau foi parar na oficina de um velho carpinteiro, que tinha por nome Antonio, embora todos o chamassem de Cerejo, por causa da ponta de seu nariz – sempre roxa e lustrosa – como uma cereja madura.
 
 
4. O menino no espelho – Fernando Sabino (Record, 1982)
 
Quando chovia, no meu tempo de menino, a casa virava um festival de goteiras. Eram pingos do teto ensopando o assolhado de todas as salas e quartos. Seguia-se um corre-corre dos diabos, todo mundo levando e trazendo baldes, bacias, panelas, penicos e o que mais houvesse para aparar a água que caía e para que os vazamentos não se transformassem numa inundação. Os mais velhos ficavam aborrecidos, eu não entendia a razão: aquilo era uma distração das mais excitantes. (...) Passado o temporal, meu pai subia ao forro da casa pelo alçapão, o mesmo que usávamos como entrada para a reunião da nossa sociedade secreta. Depois de examinar o telhado, descia, aborrecido. Não conseguia descobrir sequer uma telha quebrada, por onde pudesse penetrar tanta água. Um mistério a mais, naquela casa cheia de mistérios. O maior, porém, ainda estava por se manifestar.
 
 
 
 
 
5. Inês – Roger Mello e Mariana Massarani (Companhia das Letrinhas, 2015)
"Quando eles se conheceram, eu andava escondida no meio de outras coisas. Curva de brisa, alga vermelha, briga de passarinho. Eu ainda não era uma vez."
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
6. O livro de todas as coisas – Guus Kuijer (Martins Fontes, 2011)
"Thomas era capaz de ver coisas que ninguém mais via. Não sabia por quê, mas tinha sido sempre assim. Lembrava-se de uma violenta chuva de granizo que um dia tinha caído. Thomas pulou para dentro de um portal e ficou observando as folhas sendo arrancadas das árvores. Depois correu para casa.
- De repente virou outono – ele gritou. – Todas as coisas caíram das árvores.
(...) Thomas subiu para o quarto e pegou o livro que estava escrevendo. O título era: O livro de todas as coisas. Ele pegou a caneta e escreveu: “A chuva de granizo foi tão forte que as folhas caíram das árvores. Isso aconteceu de verdade, na rua Jan van Eyck, em Amsterdam, no verão de 1951, quando eu tinha nove anos.”
Ele olhou pela janela para pensar, pois sem janela não conseguia pensar. Ou talvez fosse o inverso: quando havia uma janela, ele automaticamente começava a pensar. Então escreveu: “Quando eu crescer, vou ser feliz.”
 
 
7. A fada que tinha ideias - Fernanda Lopes de Almeida (Ática, 1987)
 
 
"Clara Luz era uma fada de seus dez anos de idade, mais ou menos, que morava lá no céu, com a senhora fada sua mãe. Viveriam muito bem são fosse uma coisa: Clara Luz não queria aprender a fazer mágicas pelo Livro das Fadas. Queria inventar suas próprias mágicas.
- Mas, minha filha – dizia a Fada-Mãe – todas as fadas sempre aprenderam por esse livro. Por que só você não quer aprender?
- Não é preguiça, não, mamãe. É que eu não gosto de mundo parado.
- Mundo parado?
- É. Quando alguém inventa alguma coisa, o mundo anda. Quando ninguém inventa nada, o mundo fica parado. Nunca reparou?
- Não...
- Pois repare.
 
 
 
 
 
 
8. O paraíso são os outros – Valter Hugo Mãe (Cosac Naify, 2014)
 
"
 
 
"Reparei desde pequena que os adultos vivem muito em casais. Mesmo que nem sempre sejam óbvios, porque algumas pessoas têm par mas andam avulsas como as solteira, há casais de mulher com homem, há de homem com homem e outros de mulher com mulher. Há também casais de pássaros, coelhos, elefantes, besouros, pinguins – que são absurdamente fiéis. Quero dizer: há casais de pinguins e até golfinhos podem ser casais. Tudo por causa do amor.
O amor constrói. Gostarmos de alguém, mesmo quando estamos parados durante o tempo de dormir, é como fazer prédios ou cozinhar para mesas de mil lugares."
 
 
 
 
 
 
9. Kafka e a boneca viajante – Jordi Sierra i Fabra (Martins Fontes, 2009)
 
"Os passeios pelo parque Steglitz eram um bálsamo. E as manhãs, tão doces...
Casais precoces, casais parados no tempo, casais que ainda não sabiam que eram casais, velhos e velhas com mãos cheias de histórias e rugas cheias de passado procurando cantos de sol, soldados com galas de distinção, criadas de uniforme impecável, babás com meninos e meninas vestidos com esmero, casais com filhos recém-nascidos, casais com sonhos recém-destruídos, solteiros e solteiras de olhar esquivo, guardas, jardineiros, ambulantes.
O parque Steglitz transpirava vida naquele início de verão.
Um presente.
E Franz Kafka absorvia, como uma exponha, viajando com os olhos, atraindo energias com a alma."
 
 
 
10. A história sem fim – Michael Ende (Martins Fontes, 2010)
 
"Esta inscrição encontrava-se na porta envidraçada de uma pequena loja, mas, naturalmente, só tinha este aspecto quando, do interior sombrio da loja, se olhava para a rua através da vidraça. Lá fora, era uma manhã cinzenta e fria de novembro, e chovia a cântaros. As gotas escorriam pela vidraça e por cima das letras floreadas. Tudo o que se via era uma parede manchava pela chuva do outro lado da rua.De repente, a porta se abriu com tanta força que os sininhos de latão, que pendiam sobre ela, começaram a tilintar e só pararam depois de alguns instantes.O causador desse tumulto era um garoto baixo, gordo, de uns dez ou onze anos. O cabelo castanho-escuro, molhado, caía-lhe sobre o rosto; tinha o casaco encharcado de chuva e trazia a tiracolo uma pasta escolar presa por uma correia. Estava um pouco pálido e ofegante, mas, apesar de há pouco parecer ter muita pressa, continuava parado diante da porta aberta, como estivesse pregado no chão. (...)
 
O rapaz não sabia muito bem o que fazer, por isso deixou-se ficar simplesmente ali, fitando o homem com os olhos muito abertos. Finalmente, o velho fechou o livro, deixando o dedo entre as páginas, e resmungou:- Preste atenção, menino! Eu não gosto de crianças. Sei que está na moda fazer um grande alarido quando se trata de vocês... Mas comigo, não! Eu não gosto nada, nada de crianças. Para mim, são todos uns patetas choramingas, de uns desajeitados que estragam tudo, sujam os livros de geleia, rasgam as páginas e não querem nem saber dos problemas e preocupações que os adultos possam ter. Digo isto para que você não se iluda. Além do mais, não tenho livros para crianças. Espero ter sido claro.
 
O rapaz assentiu em silêncio e fez menção de se retirar; de alguma forma, porém, pareceu-lhe que não poderia aceitar aquele sermão sem protestar e, por isso, voltou-se uma vez mais e disse, baixinho:
 
- Nem todas são assim.